A Rainha de Candace e o Mordomo no Deserto

Wilma Rejane

o batismo do eunuco
o batismo do eunuco

E o anjo do Senhor falou a Filipe, dizendo: Levanta-te, e vai para o lado do sul, ao caminho que desce de Jerusalém para Gaza, que está deserta. E levantou-se, e foi; e eis que um homem etíope, eunuco, mordomo-mor de Candace rainha dos etíopes, o qual era superintendente de todos os seus tesouros, e tinha ido a Jerusalém para adoração, regressava e assentado em seu carro lia o livro do profeta Isaías Atos 8:26-27.
O eunuco mor e a rainha de Candace  eram gentios, estavam em Jerusalém para adorar o Deus dos judeus e voltavam para casa por um caminho em Gaza, uma estrada deserta e pouco trafegada. Existem algumas perguntas que poderíamos fazer considerando todo o contexto: Por que esses influentes etíopes retornavam a Africa por um caminho deserto? Por que vieram de tão distante para reverenciar O Deus de Israel? Quem era essa rainha e esse mordomo-mor?
Alguns historiadores tiveram a preocupação de recolher dados significativos sobre esses dois personagens. Candace era uma denominação dada para as rainhas mães no reino de Kush, ou Cão. Um clássico escritor romano (Calistenes) deixou registrada sua admiração pelas Candaces. Segundo ele, elas eram mulheres fortes e de uma sabedoria ímpar. Ele cita o diálogo de uma Candace com Alexandre o Grande que teria sido proibido de entrar na Etiópia:” Não menospreze nosso povo, nossa cor, porque nossas almas são tão brancas e brilhantes quanto o branco que há em você”.

Dizem que após conhecer (de longe) a defesa formidável e o treinamento dos soldados de Candace, Alexandre teria desistido de enfrentar esse povo: perder a guerra para uma general mulher, seria vergonhoso. Estrabão, em seu relatório sobre o confronto militar entre romanos e etíopes, descreve uma Candace como a maior estrategista militar que já havia visto.

A rainha da Etiópia e seu mordomo, tiveram que viajar cerca de 200 quilômetros para chegar até Jerusalém. A presença de judeus etíopes na cidade era comum, pois haviam adquirido certa influência, a Etiópia havia se tornado o primeiro centro de culto monoteísta do continente africano e tão fantástico foi o encontro do eunuco com o Evangelista Felipe, que escritores antigos como Jerônimo, contam ter sido o mordomo-mor de Candace um dedicado discípulo de Jesus, tendo apregoado o Evangelho na Arábia Felia e nas proximidades do Mar Vermelho chamada Caprobano (alguns chamam celião), onde supõe-se ter sofrido martírio pelo testemunho. O cristianismo foi reavivado como religião oficial na Etiópia no século IV, de 1644 a 1974 com a queda do imperador Haile Sellasie em 1974.

Um encontro real com Deus

O mordomo-mor era um oficial da corte, negro e castrado (eunuco). Um etíope interessado e estudioso das Escritura que parecia ter voltado de Jerusalém, incomodado com a passagem do livro de Isaías sobre o Cordeiro mudo levado ao matadouro (Isaías 53:7-8). As leituras nas sinagogas e templo, nessa época, eram feitas em voz alta e os pergaminhos do profeta Isaías que anunciam a vinda do Messias, devem ter sido centro de alguma pregação ouvida pelo eunuco que foi pelo caminho repetindo a passagem de Isaías.

E o anjo do Senhor falou a Filipe dizendo: Levanta-te, e vai para o lado do sul, ao caminho que desce de Jerusalém para Gaza, que está deserta. Atos 8:26.

A estrada era deserta, mas o mordomo não estava sozinho, nem invisível aos olhos de Deus. Filipe é avisado de forma sobrenatural que deveria encontrar o mordomo e explicar-lhe a passagem de Isaías.

Não existe lugar nenhum inacessível e oculto para Deus. Ele resgata vidas em todo e qualquer lugar da terra e utiliza as mais variadas formas de falar conosco.
O mordomo não podia entrar livremente no templo por ser considerado defeituoso. Só podia adorar do lado de fora. Não se sabe ao certo de que forma aconteceu a visita da rainha e do mordomo em Jerusalém, mas a estrada solitária, parecia refletir de fato, o estado de espírito em que se encontravam.

Apesar da posição de destaque, os judeus muito rigorosos e zelosos com a lei,devem ter proporcionado certo distanciamento entre a rainha de Candace, seu mordomo e a elite religiosa de Jerusalém.

Mas se os homens se mostram distantes de nós, por algum motivo preconceituoso, Deus não faz acepção de pessoas. O pecado e a rebeldia em ouvir Deus, são fatores que nos afastam Dele e não nossa condição física, social ou mesmo de nacionalidade.

Eis que a mão do Senhor não está encolhida, para que não possa salvar; nem agravado o seu ouvido, para não poder ouvir.Mas as vossas iniquidades fazem separação entre vós e o vosso Deus; e os vossos pecados encobrem o seu rosto de vós, para que não vos ouça. Isaías 59:1-2
Deus nos encontra nos lugares desertos. Na estrada, a caminho de Gaza, o mordomo lia Isaías em sua carruagem, nem rainha, nem condutor, ninguém era capaz de acalmar seu espírito e resolver o conflito existencial que instigava seu ser sobre a salvação. Ele lia e relia os versos de Isaías e sabia que ali havia algo mais, uma revelação. E Deus providenciou Felipe para ajudar o eunuco.

Podemos estar rodeados de pessoas, mas ainda assim não estarmos felizes. Podemos mesmo, ter uma profissão de destaque, influência na sociedade e ainda assim, viver como em uma estrada deserta e ninguém, será capaz de resgatar nossa alma da solidão, só mesmo Deus.

Ele enviou Felipe a Gaza porque ouviu a oração, a angústia e o anseio do mordomo por conhecer o Messias. Deus também viu o esforço do mordomo e da Rainha ao se deslocarem de uma distância tão grande para irem ao templo. Digamos que o templo representa uma religião, mas ela não nos salva. Ela pode revelar que há um vazio em nós, uma necessidade de encontrar o Deus que preencha esse vazio, mas assim como o mordomo e a raínha voltavam para casa, por caminho deserto, a religião também faz com que pessoas continuem desertas em si mesmas e também no olhar sobre o mundo e o outro.
Deus sabe onde estamos e quais são nossas angustias, mas é preciso que oremos a Ele.
 O mordomo-mor e a Rainha de Candace podem ter sido vitimas de preconceitos por parte dos judeus que chamavam samaritanos de impuros por serem idolatras e cananeus de cachorrinhos pelo mesmo motivo. Deus, contudo os acolheu com amor eterno, não deixou  que partissem vazios de Jerusalém. O historiador Fouard conta que a rainha de Candace também teria se convertido pelo testemunho do seu mordomo-mor.

E sobre o significado do nome mordomo-mor, há algo que vale a pena conhecer. Essa palavra, vem do grego “dunastes” (strong 1413) significando ministro real, alto funcionário da corte. Essa Palavra também é usada para descrever o reino de Cristo como uma eterna mordomia. Assim, como cristãos, somos servos e tão dedicados a nosso Senhor como o mordomo-mor deveria ser a sua Rainha.

Que Deus o abençoe.

Fonte: A Tenda na Rocha